terça-feira, 16 de agosto de 2011

O FOGO

TASSILI N'AGGER, SAARA
Equinócio de Outono, 1822

Nós somos imortais, e não se esqueça,
Nós somos eternos, e para nós o passado
É, como o futuro, presente.

Lorde Byron, "Manfredo"

Em nenhum lugar da Terra alguém poderia achar um deserto com essa precisa coloração: cor de sangue. A cor da vida.

Os berberes do deserto acreditavam que ele estava destinado a ser a pessoa que o resolveria. Seu nascimento fora profetizado. A mais antiga lenda berbere falava de uma criança nascida antes do seu tempo, com olhos azuis e cabelos ruivos, que possuiria a Segunda Visão. Charlot fechou os olhos e aspirou o aroma do local: areia, sal e cinábrio, evocando suas próprias lembranças físicas mais primais.

As lembranças que Charlot tinha do futuro sempre foram semelhantes a uma perpétua cascata d'água. Ele podia prever o futuro, embora talvez não pudesse mudá-lo. Mas, é claro, o maior dos dons também podia ser uma maldição.

Para ele, o mundo era como um jogo de xadrez, onde cada deslocamento feito gereva uma miríade de movimentos potenciais - ao mesmo tempo revelava uma estratégia subjacente, tão implacável quanto o destino, que levava o jogador incessantemente para frente. Como o jogo de xadrez, como as pinturas nas rochas, como as areias eternas - para ele, o passado e o futuro estavam sempre presentes.

... Os tauregues a chamavam de Q'ar, "A Auriga". Fora ela que, diziam eles, enfeitiçara o céu noturno com estrelas resplandecentes. E também fora ela que colocara pela primeira vez o Jogo em um curso adamantino.

O sol surgiu no horizonte, lambendo as dunas ao longe com um brilho quente e rosado.