sexta-feira, 20 de agosto de 2010
A Ilha do Dia Anterior - Umberto Eco
" O coração amado é um alaúde, que faz consonar as cordas de um de um outro alaúde, como o som dos sinos age sobre a superfície dos cursos d'água, sobretudo à noite, quando, na ausência de outro rumor, gera-se na água o mesmo movimento que se formou no ar. Acontece com o coração amante o mesmo que acontece com o tártaro, que, às vezes, perfuma de água de rosa, quando é deixado para dissolver-se na escuridão de uma adega, durante a estação das rosas, e o ar, cheio de átomos de rosa, transformando-se em água em virtude da atração do sal de tártaro, perfuma o tártaro. Nem vale a crueldade da amada. Um tonel de vinho, quando as vinhas estão em flor, fermenta e lança à superfície uma flor branca, que permanece até caírem as flores da videira. Mas o coração amante, mais obstinado que o vinho, quando floresce ao florescer do coração amado, cultiva o seu rebento, mesmo que a fonte haja secado."